O poeta e o pintor encontram-se na encruzilhada mítica, procurando decifrar os enigmas dos amores divinos para melhor entenderem as humanas paixões. As mãos de um desfiam o rosário das palavras, as do outro vão tecendo com linhas e cores. Assim vivem. Mas onde um monstra, o outro dissimula. Aqui é o poeta quem põe e dispõe dos corpos; ali é o pintor quem os retalha e oculta, deixando ao leitor a tarefa de recuperar o fio que atravessa as páginas. Os cavalos que trotam sonoros no poema, esgueiram-se rebeldes por entre os dedos do artista, deixando apenas um rasto da sua passagem. A palavra e a imagem trabalham em contraste, não há redundância. O pintor Jorge não vem à fala com o poeta Nuno, como se dignou fazer o pintor Paolo em Florença.
Quando os poemas de Nuno Júdice dizem, explícitos e evocativos, os traços e as cores do Jorge Martins encobrem, neste desfasamento se construindo um sábio jogo erótico de revelar e esconder que acirra o desejo.
O desejo de ler outros livros de Nuno Júdice e de ver mais desenhos e telas de Jorge Martins.
O poeta e o pintor estão lado a lado, fechados nas páginas do livro, prontos para recuperarem a autonomia das próprias trajectórias, levando consigo os amantes da poesia e da pintura.
Preparemo-nos para os seguir.