«Caso-me e pronto».
Nessa ocasião não lhe perguntei o significado que ela atribuía a esse «e pronto». De facto, talvez Ana Luísa não soubesse, estão, claramente o sentido dessa breve, conclusiva expressão, pronunciada num tom onde me pareceu transparecer algo de amargura e de revolta. E ainda que o conhecesse, é provável nessa idade não tivesse a coragem ou a desenvoltura suficiente para o comunicar. Mais: embora aparentemente Ana pudesse ser considerada pessoa extrovertida, até impetuosa, explosiva na afirmação de opiniões, como disse parecia-me restar sempre nela uma ponta se secretismo, algo de inatingível ou de incomunicável. Já nesses tempos da adolescência me deixava a impressão de esconder um formidável segredo, sempre protegido do perigo de alguma confissão descuidosa, talvez por uma intransponível muralha de pudor, talvez por uma vigilante medida cautelar. Em suma, muitas das suas atitudes pareciam oscilar entre uma impulsiva necessidade de afirmação e uma barreira de recuo defensivo.»